Primeiro lugar geral no II Meeting Internacional Odontológico do Tocantins. Essa foi a mais recente conquista de um grupo de professores e alunos do curso de Odontologia da Faculdade de Ciências do Tocantins – FACIT no final do mês de outubro. A premiação foi para o trabalho científico sobre as orientações para a saúde bucal de deficientes visuais desenvolvido pelas docentes Eliana Andrade, Amanda Mortoza e Ana Lúcia Roselino Ribeiro e os acadêmicos Isabela Maia e Evaldo Bezerra Oliveira, e parte do projeto de extensão “O essencial é invisível aos olhos”.
“Tomamos a decisão de participar do Meeting em agosto. Aguardamos dois meses até a aprovação do trabalho, foi muita ansiedade e tensão. Aprovaram com um mês antes do evento e foi aquela correria para ajeitar tudo. Mas foi muito gratificante termos alcançado esse feito”, conta a aluna Isabela, que apresentou o trabalho no evento.
Trabalho de muitas mãos
Segundo a professora Eliana Andrade, a ideia do trabalho surgiu de um outro trabalho desenvolvido por ela no tempo de faculdade, na cidade de Uberaba (MG), quando fez um estágio no Instituto dos Cegos Brasil Central. “Desenvolvemos um manual de saúde bucal e macro modelos de dentes, escovas e outros componentes para atender o público deficiente visual”, explica.
Sabendo do gosto e da responsabilidade da aluna Isabela pela pesquisa, foi feito o convite para desenvolver um trabalho neste sentido. “Convidei a professora Amanda, que convidou a professora Ana, ambas apaixonadas por pesquisa, e que, por sua vez, convidaram o graduando Evaldo pela sua habilidade manual para fazer os macro modelos”.
Eliana muniu a aluna e os demais professores de artigos científicos voltados para esse público, filmes e modelo de livros sensoriais para ter uma ideia de como estruturar o trabalho. O resultado foi a elaboração do livro sensorial, dos macro modelos e de um manual de saúde bucal em braile.
No entanto, o esforço precisava passar por uma aprovação fundamental. “O manual foi revisado por uma deficiente visual do instituto lá de Uberaba. Queríamos ter a certeza que a linguagem do livro estava adequada para o público em questão. É preciso ter cuidado com isso porque muitos possuem apenas o primeiro grau de escolaridade”, informa a professora.
Curiosidade
A premiação também teve um fato curioso. Um dia antes da apresentação do trabalho, Isabela e uma comitiva de alunos e professores da FACIT assistiram à palestra do renomado cirurgião-dentista internacional, Ronaldo Hirata, que citou um caso de atendimento a uma mulher deficiente visual. “Ele tinha dito que há algum tempo queria voltar a sentir a verdadeira emoção em ser dentista e foi nessa situação que ele conseguiu resgatar este sentimento. Fiz questão de mostrar o nosso trabalho e ele gostou muito, disse que nunca tinha vista algo do tipo. Ficamos honradas porque ele é um profissional bastante vivido na Odontologia, trabalha nos EUA”, disse a acadêmica.
Atividade de longo prazo
O trabalho apresentado no Meeting foi o ponta pé para outras atividades que já estão sendo desenvolvidas na clínica odontológica da FACIT, conforme explica a professora Ana Lúcia. “A ideia é treinar todos os professores e alunos para atender os deficientes visuais. Queremos nos tornar um polo para receber esse público. É importante ressaltar que, antes de falar sobre saúde bucal, é preciso criar mecanismos para que eles compreendam o que é o dente, como ele é, qual a melhor forma de escovar”.
Inclusive, o projeto de extensão já está acompanhando um jovem cego na clínica da faculdade e empregando as ferramentas desenvolvidas para esta finalidade. “Ele se sente muito bem com isso, está bastante motivado e isto é necessário para que os cuidados com a higiene bucal continuem em casa”, reforça a professora Ana Lúcia.
Ganho social
O envolvimento de alunos e docentes no desenvolvimento do trabalho trouxe reflexões importantes. “O impacto social é indiscutível. Nos pilares da pesquisa, devemos analisar qual será o benefício para a sociedade. E quando alcançamos um resultado que impacta no meio, é maravilhoso”, disse a professora Amanda Mortoza.
Outro momento bastante tocante na estruturação da pesquisa foi quando os macro modelos começaram a ser produzidos pelo graduando e protético Evaldo. “Eu estava esculpindo e aí fechei os olhos para poder sentir o que estava fazendo. Foi uma experiência única e me emocionei bastante”, conta.
O futuro
O projeto terá novos desdobramentos. O próximo passo, segundo a professora Eliana, será gravar o barulho da clínica durante um atendimento odontológico. “Queremos passar para os alunos que é necessário ter um cuidado grande na hora de manusear o instrumental de trabalho. Uma das formas dos deficientes visuais se relacionarem com o ambiente é pela audição e temos que respeitar isso”.
Outras iniciativas são transformar o manual de saúde bucal em um áudio-book para atender os cegos que ainda não sabem ler em braile, trabalhar com técnicas de sensibilização usando gelo para explicar os efeitos da anestesia, usar movimentos corporais para mostrar as formas de escovação – circular e vai e vem – e trabalhar a manipulação da escova de dente durante a escovação por meio de adaptações da tecnologia assistida.
(Foto: Ricardo Sottero)